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SEM CAMPEÕES

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Postado em 06/02/20 - 17:02

O quadro global dificulta o surgimento de novos campeões de popularidade no Brasil. Por outro lado, os melhores fundamentos também reduzem as chances de recordes de impopularidade, como visto no passado recente.

Roberto Padovani
04 de fevereiro 2020

 

As pesquisas de aprovação do governo têm mostrado estabilidade, oscilando para melhor no último dado. Este quadro não deve mudar de modo radical. Dificilmente teremos novos campeões de popularidade ou impopularidade como no passado recente.

O desempenho da economia, tradicional termômetro da qualidade de gestão de um País, explica este cenário. Por um lado, o crescimento não deverá ser forte o suficiente para produzir altas expressivas na popularidade. A exuberância do período de 2004 a 2012, quando o ciclo de commodities fez com que o comércio local crescesse a taxas anuais médias de 8%, não deverá se repetir.

Sem a ajuda externa, é pouco provável que a aprovação do presidente supere de modo significativo a média de cerca de 35% observada desde 1987 e próxima à referência  internacional para o sucesso eleitoral de um presidente1. Aprovações acima deste nível médio sempre estiveram associadas a períodos de forte expansão internacional, o que reforça a tese de que boas avaliações são geradas mais pela sorte de um ciclo global favorável que pelo mérito de uma boa gestão2.

Mas tampouco há espaço para um novo colapso econômico e político. A responsabilidade na gestão da economia e as reformas em curso há três anos reconquistaram a estabilidade macroeconômica, permitindo a volta do investimento privado e a ancoragem de inflação e juros em patamares historicamente baixos. Com isso, tanto os eventos domésticos deixaram de ser fonte de volatilidade, quanto a trajetória de recuperação tornou a economia mais resistente a choques.

Isso traz maior estabilidade na avaliação do governo. A ideia é que a popularidade é preservada quando um choque externo adverso gera efeitos menores no Brasil que em outras economias. Os anos de 1998 e 2009 são exemplos de momentos em que a população identificou corretamente o aumento do desconforto social – desemprego e inflação – como tendo uma causa essencialmente externa.

Ao contrário, o presidente é pior avaliado quando um choque externo desfavorável produz impactos relativamente maiores no País, movimento percebido como sinal de má gestão. Foi o caso da recessão de 2014, quando as distorções e fragilidades domésticas potencializaram o choque externo e fizeram com que a economia brasileira contraísse cerca de 7% entre 2015 e 2016, enquanto seus principais pares sul americanos cresciam a um ritmo de 4% no mesmo período.

O momento atual parece mais próximo ao primeiro caso. A expectativa para o biênio 2019-20 é de um crescimento acumulado de 3,5% no Brasil, acima da média sul-americana de cerca de 3,0%. Neste caso, o mérito ajuda a controlar os danos políticos gerados pelo contexto externo.

Descartados os extremos, em uma situação em que a economia cresça a um ritmo médio de 2,5% e reduza, com isso, a ociosidade do mercado de trabalho, indicadores como varejo e confiança podem convergir para suas médias históricas e fazer com que a aprovação do presidente tenha uma leve tendência de alta.

De fato, como os dados de atividade explicam estatisticamente a aprovação do governo, então é possível desenhar trajetórias para a popularidade a partir das hipóteses acima. Usando as médias trimestrais dos dados de varejo (IBGE) e de confiança do consumidor (FGV) como variáveis explicativas de um modelo de projeção para a avaliação “ótimo/bom” do governo (Datafolha), as estimativas indicam um valor ao redor de 35%.

Embora haja várias especificações alternativas para estes modelos estatísticos e os resultados sejam pouco precisos, a ideia é que o desempenho do crescimento será fundamental para manter e/ou favorecer a aprovação do presidente. Ou seja, a economia deverá influenciar  mais fortemente a política a partir de agora3 , ao contrário do movimento atípico dos últimos cinco anos em que a crise aguda deu protagonismo à questão política. Não por outro motivo, polêmicas nas áreas de meio ambiente, cultura, costumes e educação produzem impactos moderados sobre o crescimento e, com isso, sobre a popularidade.

Pode não parecer muita coisa, mas já é um avanço em relação à situação atual. Após a tradicional lua de mel de início de mandato, os níveis de aprovação têm oscilado ao redor de 30%, patamar compatível com a volatilidade internacional e com a lenta recuperação da confiança e do emprego.

Isso significa que o baixo crescimento global não dará vida fácil ao governo, que já segue o padrão mundial de frustração com a política. Este nível de popularidade deixa o cenário propenso a acidentes e estimula a continuidade de um ambiente de ruídos elevados. Por outro lado, o espaço para populismo segue restrito, fazendo com que a responsabilidade econômica sustente tanto o melhor desempenho relativo do País quanto a avaliação do governo.

Neste momento, portanto, dificilmente teremos campeões de popularidade ou impopularidade como no passado recente. O cenário ainda é de transição, com continuidade da volatilidade política, mas sem novas crises de governabilidade.

 


1 Eurasia Group, “Brasil, reformas ambiciosas, raiva da classe média e governo minoritário”, 2020. A Eurasia estima como referência para o sucesso eleitoral de um presidente o patamar de 40%, avaliado pelo critério “aprova/desaprova”. A partir deste estudo, o patamar equivalente para o conceito “ótimo/bom” poderia ser algo ao redor de 30%, dado que o desvio médio histórico entre os conceitos é de 13 pontos percentuais.

2  Campello, Daniela; Zucco, Cesar Jr. “Presidential success and the world economy”, The Journal of Politics, 78, Dec/2015. Os pesquisadores usam como indicadores de ciclo os preços de commodities e os juros internacionais.

 3  Garman, Christopher, “A economia pautará a política nos próximos anos”, Agência Estado, 10/10/2019.

 

ROBERTO PADOVANI é economista-chefe do Banco Votorantim

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